sábado, 10 de dezembro de 2011

Conselho de Classe: a que se propõe? O que produz? Para que serve?



A prática pedagógica do Conselho de Classe representa, na escola, aquilo que Foucault (2002) declara ser o mecanismo fundamental da técnica do exame: a objetivação. O Conselho de Classe, momento ritualizado de exame, ao dizer sobre cada aluno/a, ao registrar tudo o que é considerado importante, elabora um conjunto de estratégias que tornam o indivíduo "efeito e objeto de poder, efeito e objeto de saber"(p.160). Na prática disciplinar, na qual o exame é elemento importante, "a vigilância permanente [e] classificatória" (p.107), produz o que poderíamos chamar de sujeito pedagógico (LARROSA, 2002), na medida em que as falas de especialistas não impõem características externas às crianças das quais falam, mas as constituem enquanto sujeitos que internalizam discursos e práticas que ensinam modos de se narrar, se ver, se perceber e se relacionar consigo mesmo e com os outros.
As falas sobre os alunos são representativas enquanto falas que dizem das maneiras de ser e agir consigo mesmo e com os outros. Elas anunciam um jeito específico de como estas crianças percebem a si mesmas, como elas se posicionam em relação aos grupos dos quais participam e de suas atitudes com os/as colegas. Desta forma, mais uma vez recorro a Larrosa (2001) para dizer que estas crianças, assim como as demais, são posicionadas "em relação a uma verdade sobre si que eles mesmos devem contribuir ativamente para produzir"(p.55). Assim, é possível dizer que suas identidades e subjetividades são efeitos da forma como são descritos/as, percebidos/as, narrados/as nas e a partir das diferentes práticas pelas quais passam.

A prática do exame, técnica do poder disciplinar, faz com que o sujeito avaliado esteja sob um campo de visibilidade sempre constante. Desta forma, o Conselho de Classe, para cumprir sua função, exige das professoras um olhar cotidiano, detalhado sobre cada indivíduo para que, durante o Conselho, possam contar, explicar, lembrar e definir, a partir daquilo que observaram e obtiveram como informação sobre a aprendizagem e desenvolvimento de cada um, o tipo de progressão adequada para cada aluno/a.

Esta prática que vigia, controla, fala sobre os indivíduos, produz saberes sobre eles e os produz enquanto sujeitos, inscrevendo em seus corpos marcas de uma prática examinadora que compõe espaços "de observação normalizadores e normativos"(VARELA,1995, p.44). Ao normalizar e normatizar conhecimentos, saberes e verdades sobre cada indivíduo converte cada aluno/a em um sujeito particular dotado de uma natureza específica. Assim, naturaliza comportamentos, atitudes e aprendizagens produzindo diferenças e estabelecendo parâmetros de constituição de identidades e subjetividades.

O Conselho de Classe, analisado como espaço disciplinar, se constitui marcando corpos conforme as normas estabelecidas pela proposta curricular e pela instituição escolar. Corpo/s que, ao longo de suas histórias escolares, têm sofrido efeitos de poder, transformando-se no que hoje são. Como muito bem observa Souza (2001) "se quisermos entender como fomos formados e nos (trans)formamos nas pessoas que estamos sendo, precisamos procurar entender como funcionam os processos permanentes de sujeição e produção dos corpos"(p.125).

Portanto, enquanto professores/as é fundamental refletirmos, justamente, sobre aquilo que é o mais comum, habitual e por isso mais difícil de ser problematizado "porque se converteu em hábito para nós, em costume, em identidade. É preciso converter aquilo que somos em problema, o habitual em insuportável, o conhecimento em desconhecido, o próprio em estranho, o familiar em inquietante[...](LARROSA apud SOUZA, 2001, p.125-126). Isto porque a transformação,  em concordância com Foucault ( 2003a), só é realizada quando os/as profissionais das instituições escolares, se chocarem com impasses, enfrentamentos entre si e consigo mesmos/as, impossibilidades, críticas, embaraços entre outras dificuldades que permitam agir de outra forma, que exijam um tipo de pensamento para a mudança e não quando apenas e facilmente colocarem em prática soluções, propostas e idéias de reformadores da educação.

Autoria: Professora Mirtes Barbosa.


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