Desenhar é, antes de tudo, motor. Ao observarmos uma criança pequena desenhando, podemos ver que seu corpo inteiro funciona e a criança sente prazer nesta gesticulação. Ao prazer do gesto associa-se o prazer da inscrição, a satisfação de deixar uma marca: nos desenhos do vizinho ou sobre livros e folhas estimados pelo adulto (possessão simbólica do universo adulto admirado pela criança).
Quando atinge a idade escolar, verifica-se uma diminuição da produção gráfica: a escrita passa a ser concorrente do desenho e tem início o desenvolvimento do hemisfério esquerdo do cérebro, que é o lado que usa símbolos para acelerar o pensamento.À medida que vai sendo alfabetizada, a escola se encarrega de afastar a criança desta forma de expressão e ela, como muitos de nós, vai dizendo que "não sabe desenhar". O que precisa ser feito, então, é propor que “desliguemos” um pouco o lado esquerdo que está dominando e “liguemos” o lado direito, que é o hemisfério que sabe ver o desenho como só os desenhistas sabem ver.
Através do desenho livre, a criança desenvolve noções de espaço, tempo, quantidade, seqüência, apropriando-se do próprio conhecimento, que é construído respeitando seu ritmo. Aprende também a função social da escrita, pois sua comunicação, feita através do desenho, pode ser compreendida por outras pessoas antes que ela aprenda a usar a escrita convencional para se comunicar. Escrita e desenho podem, então, misturar-se (escrever palavras no desenho) ou confundir-se (a escrita torna-se um jogo e o alfabeto um pretexto para novas variações).
Os desenhos infantis são matéria privilegiada no campo da psicologia, o que significa que nem professores ou educadores de infância estão completamente treinados para decifrar desenhos. Porém, existem sinais de alerta, presentes nos desenhos das crianças, que podem despertar pais e professores para situações anormais.
Há um certo número de razões que parecem tornar “explicáveis” as produções infantis. Como o repertório de signos é infinitamente mais reduzido que no adulto, eles parecem mais reconhecíveis.Tudo o que diz respeito à criança (experiências, sentimentos) atua sobre sua evolução dos signos da linguagem plástica. Tal evolução se faz por etapas, no decorrer das quais se podem observar a ocorrência de regressões a um estágio anterior do grafismo, significativas de um distúrbio profundo ou de uma crise passageira. A criança zangada rabisca com energia, a angustiada barra com traços negros o desenho que acabou de fazer.Tais regressões podem produzir-se tanto de um desenho para outro, quanto dentro do mesmo desenho, com um personagem- irmão(ã) cuja existência não é aceita- recebendo um grafismo mais rudimentar.
Não é válido avaliar o desenho isoladamente, mas considerar, para além da idade da criança, a sua personalidade, o seu desenvolvimento cognitivo e ainda o seu historial de desenhos. Em adição, há, naturalmente, o contexto do desenho, ou seja, sugere-se que o adulto fale frequentemente com a criança sobre aquilo que desenha.
Como os adultos nem sempre vêem o que o imaginário das crianças transpõe para o papel, é essencial manter um diálogo aberto sobre os desenhos infantis. Procurar descobrir a “história” por de trás de cada desenho. e verificar um ou mais “sinais de alerta”. É importante reunir os desenhos mais recentes da criança, para verificar se existe uma recorrência desse padrão ou não. O acompanhamento dado à criança por um profissional habilitado, em caso de evidência de dificuldades, é essencial para o seu desenvolvimento pessoal.
O desenho tanto pode revelar algo negativo, como não. Mas, independentemente da conclusão final, é sempre preferível saber e descobrir antecipadamente algo que esteja menos bem na vida da criança.